Pra começo de conversa,
Minha vida era tranquila,
Não preocupava com nada,
Nunca fiquei numa fila!
Saúde era o que eu mais tinha
E a cabeça era fresquinha
Que nem pote de argila!
Vivia tranquilamente
Cantarolando assovio,
Com um “batoque” na mão,
Caçando na beira do rio,
Hoje vivo pesaroso,
Pois esse tempo gostoso
Me abandonou e sumiu!
As oito horas que hoje
Me ocupo trabalhando,
Gastava dentro do rio
Com os amigos brincando!
Com os olhos feito brasa,
Só retornava pra casa
Com o dia já turvando!
O rio era nossa praia,
Nossa área de lazer!
Ninguém nunca se cansava
De pular e de correr,
Brincava de galinha cheia
E de castelo de areia
Até o escurecer!
De tudo a gente brincava,
De futebol, baleada
E de tanto mergulhar
Naquela água adorada,
Meu corpo era acinzentado
E o cabelo sapecado
Feito uma manga chupada!
Quando chegava em casa
Numa fome de leão,
Da porta mesmo eu gritava:
– Ô mãe me dá aí um pão!
E logo o choro explodia,
Quando ela respondia:
– A menino, não tem não!
Depois de alguns minutos
Eu naquela choradeira,
Feito um caminhão pesado
No topete da ladeira,
Mãe gritava: – Aqui danado!
Dava-me algum trocado
E eu “pocava” na carreira!
O caminho já era liso
Feito asa de besouro!
De casa pra padaria
Do finado Zé do Ouro,
Um pão e dois bolachões
Resolviam as questões
Da minha fome e do choro!
Meu ofício era brincar
Durante a semana inteira,
Brincar de soltar pneu,
De carro de descer ladeira,
Tempos bons que eu vivi,
Nesse tempo eu conheci
Felicidade verdadeira!
E os brinquedos com os quais
A gente se divertia,
Eram feitos por nós mesmos,
Todo menino sabia
De forma artesanal,
Fazer um carrinho de pau
No tempo da estripulia!
Tempo de chupar umbu,
Araticum, gabiraba,
Subindo nos umbuzeiros
Com medo de vaca braba!
Ê tempinho adorado,
É como diz o ditado:
Coisa boa logo acaba!
Nas noites enluaradas
Meus pais sentavam lá fora,
No passeio lá de casa
E aí na mesma hora,
Sem demora e sem atrasos
Começava a contar casos
Do saci, da caipora…
No lugar da tal novela
Que tem na televisão,
Ouvíamos as histórias
Do bando de Lampião,
Bocage, Pedro Malazarte
E tudo isso era parte
Da nossa educação!
As histórias de João Bobo
Disputando com o rei,
Ê coisa maravilhosa
Que do meu pai escutei!
Assim não há quem esqueça,
Por isso aqui na cabeça
Tudo isso eu guardei!
No lugar do facebook,
Da contemporaneidade!
Nos brincávamos de tonga,
Sem malícia, sem maldade,
De mé mé mé, pega – pega
De ciranda, cabra cega
Na maior felicidade!
E depois na madrugada
Do dia posterior,
Acordava ouvindo a voz
De Zé Beto locutor,
No rádio fazendo alerta,
Divulgando a hora certa
Ao homem trabalhador!
O rádio em cima da mesa,
Sem o botão derradeiro!
De vez em quando uma moda
Na voz de Tião Carreiro,
Um cinzeirinho de barro
Mais um papel de cigarro,
Um canivete e um isqueiro!
Do meu quarto pra varanda
Eu via meu pai em pé,
Com um cigarro de fumo,
Mãe coando o café,
Hoje fico até doente,
Ao ver tudo diferente
Do que foi pra o que é!
A criançada de hoje,
Não quer o que a gente quis,
Vive a contrariar
Tudo que a gente diz!
Apesar do sacrifício,
Naquele tempão difícil
Eu era em mais feliz!
Pois eu nunca imaginava
Que fosse perder meus pais,
E nem que a fase adulta
Roubasse a minha paz,
Numa afirmação correta
Faço couro ao poeta,
TEMPOS QUE NÃO VOLTAM MAIS!